A palavra «férias» está repleta de expetativas. É uma caixinha que, supostamente, tem lá dentro o descanso, a diversão, o riso e a descontração. É suposto ser uma borracha que apaga o cansaço e as inquietações oriundas de um ano cheio de trabalho e de resolução de problemas.
Então porque é que, tantas vezes, não o é? Porque, tantas e tantas vezes, ainda ficamos mais cansadas e tristes? Ou até mais deprimidas do que antes? Podem ser duas as razões para que tal aconteça:
1. Falsas expetativas e falta de organização (relativamente a um agendamento mental de várias e diferentes atividades/o desejo de conseguir fazer muita coisa);
2. Muito tempo livre sem entretenimento.
A primeira razão aqui apresentada pode ser o gatilho para a frustração. Repare: imagine que tem 15 dias de férias no verão e que as outras duas semanas a que tem direito (ou que decide tirar) estão distribuídas pelos restantes meses do ano ou época natalícia. Em princípio, as suas férias principais serão aquelas que coincidem com o padrão social (e transversal à maioria), situando-se no verão.
O que se observa é que muitas pessoas agendam (nem que seja mentalmente) demasiadas atividades para essas duas semanas. Por exemplo: além de irem passar uns dias à praia (ou não irem a lado nenhum, mas ficarem uns dias, de facto, sem fazerem nada de especial), também tencionam fazer as «limpezas grandes» ou pintar a casa, etc. Tencionam arranjar, finalmente, a lareira, para estar preparada no inverno, e ainda pensam em ir visitar a tia Judite, que mora a 100 quilómetros de distância. E, nos intervalos de tudo isto, pretendem ter mais horas de ócio e dormir até tarde.
Muitas vezes, o que acontece é que as atividades agendadas e pretendidas ocupam mais tempo do que aquilo que imaginámos. Como tal, pode acontecer que, nesses 15 dias, aquilo que se conseguiu fazer foi usufruir dos tais dias para ir àquele lado, porque já estava marcado, mas as limpezas não foram concluídas, nem o arranjo da lareira foi feito. A visita à tia Judite foi à pressa e já sobre alguma tensão. E não existiram momentos de ócio, nem muitas manhãs a dormir até tarde.
Esta não concretização das tarefas que se têm em mente para realizar nas férias traz angústia e frustração. E, durante as férias, o que houve provavelmente na mesa emocional foi a ansiedade – a ânsia de conseguir fazer tudo o que estava planeado. Essa ansiedade continuou a desgastar o cérebro e o sistema nervoso, que tudo comanda.
Obviamente que, assim, ninguém descansa porque há um excesso de energia a ser gasto e cansadas já estamos nós. No fim das férias, o olhar para o tempo que passou e o sentir que, além de não termos descansado nada, também não realizámos as tarefas desejadas, é o gatilho que origina o estado depressivo.
Falta de força, de energia e tristeza (com ou sem choro inconsolável) podem ser estados que caracterizam a forma como terminou as suas ditas férias, sabendo que amanhã já tem de regressar ao trabalho. É uma sensação muito desagradável e de difícil consolo. Sabemos que, agora, só no Natal ou só no próximo verão teremos mais uma oportunidade para usufruir do merecido descanso. Será? Ou há outra forma de compensar tudo isto, todo este aparente tempo perdido? Boa notícia! Há, sim, uma forma de ir compensando esses dias de férias frustradas. Como sempre, vai depender de si, da abertura que der ao assunto e de tentar pôr em prática algumas dicas. Mais abaixo, falo sobre alguns truques que podem ajudar a diminuir o cansaço e a ter alguns momentos de «férias», mesmo durante a semana, ao longo do ano.
Antes disso, é preciso falar sobre a possível segunda razão, o segundo motivo que pode desencadear, similarmente, estados depressivos depois das férias: excesso de tempo livre sem atividades. Estranho, certo? Deveria ser o contrário.
Há uma zona do nosso cérebro (Modo Padrão ou Default Mode) que fica ativa quando decidimos, por exemplo, sentar-nos e tentarmos não pensar em nada. Essa zona, que é a «zona das preocupações», por assim dizer, fica imediatamente acordada, de forma a nos lembrar daquilo que pode ser menos bom para nós. Então, se não houver um foco propositado numa coisa qualquer (de preferência positiva), a possibilidade de nos virem pensamentos relacionados com o que mais nos afeta na vida é muito grande.
Portanto, depois de um ano cheio de entretenimento cerebral, onde poucas pausas de qualidade se fizeram, pode acontecer que, nesses dias de suposto ócio, com mais tempo disponível, sem estarmos tão entretidas, haja um encontro com o nosso Eu e com alguma realidade que tenhamos andado a evitar. Esse encontro com o que tem andado a ser ignorado pode ser bastante avassalador e pode trazer à tona sentimentos menos aprazíveis, causando sensações físicas muito desagradáveis.
Dicas para superar a depressão pós-férias
Obviamente que nenhuma das seguintes dicas dispensa a intervenção de um profissional competente para o efeito, caso sinta que não está a melhorar. De qualquer forma, não perde nada em tentar.
- Não esquecer as dicas base do artigo Gestão do Stress e Ansiedade (parar algumas vezes por dia com qualidade, alimentar-se bem, dormir bem, praticar desporto, sociabilizar, etc.).
- Almoçar e jantar fora do local de trabalho é muito importante. Se estiver em teletrabalho, não almoce no escritório nem o faça na secretária onde está a trabalhar. É importante descansar a vista dos ecrãs e a mente das notificações.
- Na hora de almoço e/ou jantar/lanche deve sair à rua, nem que seja por 15/20 minutos e descansar a vista noutra paisagem, respirando profunda e conscientemente (caso possa, deve fazê-lo sempre sem máscara). Encare os fins-de-semana como dias de férias (mesmo!). Se agendar algo, não planeie demais. As atividades que não são lazer devem ser minimizadas e, de preferência, não devem ocupar mais do que uma das tardes desses dias. Há quem dê preferência à tarde de sábado para o fazer, para ficar com o domingo totalmente disponível.
- Comunique mais e melhor, com quem deseja que a ajude. Caso contrário, não espere que quem está habituado a não fazer nada se disponha a ajudá-la.
- Durante o dia, numa das vezes que for à casa de banho, observe-se e converse consigo. Tente perceber como está e do que está a precisar naquele momento. Tente fazer algo por si nesse dia.
- Repetir o ponto 4 e fazer dos seus fins de semana dias de férias, onde até consegue realizar uma ou duas atividades do lar, mas também consegue sair, descontrair e descansar.
Se não se organizar melhor relativamente ao seu descanso, ainda que tenha muita gente que a ame, ninguém o vai fazer por si. Todas essas pessoas estão, similarmente, a tentar viver as suas vidas da melhor forma que conseguem. Faça o mesmo e recupere o seu Eu e a sua energia de vida.
Vanda do Nascimento é terapeuta, formadora e instrutora de Mindfulness na Escola de Mindfulness Essencial, fundada por si em 2016. Começou, em 1997, a sua carreira como professora, ao licenciar-se em Educação. Nessa mesma data, também iniciou os seus estudos em Reiki, Meditação e Atenção Plena. Posteriormente, enveredou pelos caminhos da Psicologia e aprofundou, ainda mais, a temática do Mindfulness, de forma a continuar a sua luta no controlo do stress e da ansiedade.