Catarina Ferreira Pinto, entusiasta de uma vida mais sustentável e de um estilo de vida com menos desperdício, autora do blogue Do Zero, escreve-nos sobre como podemos elevar a nossa vida a um patamar mais amigo da nossa maior casa, que é a Terra. Para ler, abaixo.
Emergência Climática
Estamos em emergência climática. Ouvimos esta frase quase todos os dias e sentimo-nos simultaneamente culpadas e impotentes face ao desastre ambiental que se avizinha.
Se este artigo só servir para uma coisa, que seja para lhe dar esperança. Felizmente, há muito que podemos fazer no nosso dia a dia para diminuirmos a nossa pegada ambiental e o melhor de tudo é que, não só vai ser bom para o ambiente, como para a carteira.
Fique a par de dez medidas que pode pôr em prática no dia a dia para uma vida mais sustentável. Se começar a seguir uma nova a cada mês, chega ao final do ano com a lista concluída e sem ter dado pelas mudanças! Vamos a isso?
Tendo em conta que o combate ao desperdício alimentar é a medida de maior impacto que podemos adotar enquanto consumidoras individuais (basta ver que é a terceira medida global com maior impacto ambiental, com potencial de reduzir mais de 70 GigaToneladas de CO2e, segundo o Project Drawdown), as três primeiras medidas que lhe vou sugerir são muito importantes (e muito simples!):
- Planear as refeições antes de ir às compras. Quando planeia as refeições, sabe exatamente que ingredientes (e quantidades) comprar. O ideal é todas as semanas (ou de quinze em quinze dias) esvaziar o frigorífico, porque consumimos todos os alimentos, antes de voltar a fazer compras. Existem inúmeras aplicações que ajudam a planear as refeições, como a Cookidoo (não é gratuita), o site Savethefood, o meu Excel Do Zero ou mesmo páginas de Instagram, como as da Joana Costa Roque e da Vânia Ribeiro.
- Confecionar sem desperdiçar alimentos. Parece simples, mas se olhar para o lixo orgânico que faz em casa, certamente que se apercebe de que muitos dos nossos alimentos vão parar ao caixote do lixo. Ou porque não queremos usar o talo dos brócolos, ou porque só usamos a parte branca do alho francês, ou porque descascamos ingredientes. A verdade é que pouco deveria ir parar ao contentor (afinal, numa abóbora, até as sementes podemos aproveitar!). Se estiver sem ideias de como aproveitar os alimentos, pode sempre espreitar este artigo ou, mais uma vez, o site Save the Food.
- Salvar comida que se iria estragar (e parar ao lixo). Aqui entram aquelas frutas e legumes mais maduros, que ficam esquecidos nas prateleiras dos supermercados, entram os cabazes Fruta Feia, a compra de produtos em fim de validade (geralmente os supermercados colocam um selo nestes produtos e até estão mais baratos!) e entra a utilização de apps como a TooGoodToGo, a Phenix, a Fairmeals ou mesmo a OLIO (na era tecnológica, temos zero desculpas para desperdiçar comida).
O segundo gesto com mais impacto que podemos implementar em prol do planeta é adotar uma dieta de base vegetal. Diz o Projeto Drawdown, que estima que esta adoção levaria a uma redução de 66 GigaToneladas de CO2e e diz a comissão EAT-LANCET (vale a pena ler o relatório, aqui). Assim, a quarta dica não poderia ser outra que não...
- Adotar uma alimentação de base vegetal. Não é necessário ser vegan (embora seja bem-vinda quem quiser dar este passo extra), nem mesmo vegetariana, mas temos urgentemente de reduzir o consumo de proteína animal, especialmente carne de vaca, cujas emissões de metano, em Portugal, representam mais de 5% do total de emissões do nosso país. Se precisar de um «empurrãozinho» neste sentido, pode consultar o VeggieKit da Associação Vegetariana Portuguesa (gratuito) e as páginas Simplesmente Vegan, O Vegetariano, Laranja Lima Nutrição e Made By Choices (há muitas contas, mas estas apresentam conteúdo muito bem estruturado, desmistificam preconceitos e dão dicas e receitas simples de seguir).
Ao adotar uma alimentação de base vegetal, já estamos a reduzir drasticamente o nosso consumo de água (isto porque está estimado que a nossa pegada hídrica humana esteja em 92% relacionada com a alimentação e sabemos que a carne – e o cacau – são dos alimentos com uma maior pegada hídrica). Ainda assim, deixo-vos mais duas dicas muito simples para poupar ainda mais água.
- Repensar o consumo de moda. A indústria da moda, além de contribuir para 8-10% de todas as emissões de gases de efeito de estufa a nível mundial (dados das Nações Unidas), é responsável por 20% do desperdício de água mundial (basta pensar que, para fazer um par de calças de ganga, são necessários mais de 7500 litros de água). Assim, cabe-nos pensar, antes de cada compra: "Será que preciso de mais uma t-shirt ou posso poupar aqui 2500 litros de água, que é mais do que a água necessária para uma pessoa beber durante mais de 4 anos?".
- Reservar a água de aquecer o banho. Parece coisa pouca? Se fizermos as contas, vemos que, em média, gastamos 5 litros de água desde que ligamos o chuveiro até que a água aquece. Isto significa que, por mês, estamos a deitar «cano abaixo» 150 litros de água. São 1800 litros de água por ano. É desnecessário. Há duas hipóteses: colocamos um sistema de aquecimento rápido da água ou, mais económico, recolhemos a água de aquecer o duche com um recipiente (se usarmos um dispensador com torneira, fica super simples de utilizar, mais tarde, esta água na cozinha – encontre, aqui, um exemplo).
Continuando na lógica de evitar o desperdício (de bens, de recursos e até de dinheiro – quem não adora poupar a carteira enquanto poupa o ambiente?), é importante perceber que recusar produtos descartáveis tem um impacto enorme nos nossos ecossistemas. Não só porque tudo o que utilizamos utilizou água, energia e matérias primas para ser produzido, mas também porque a maioria dos produtos de utilização única não é reciclável (basta pensar que, para o ecoponto amarelo, apenas devem ir EMBALAGENS – sim, isso significa que talheres de plástico não devem ser encaminhados para reciclagem). Assim, as próximas três dicas são:
- Andar sempre com uma garrafa de água reutilizável. Não precisamos de nada demasiado caro nem complicado. Eu ando com um frasco de vidro que era de uma polpa de tomate. Simples assim. Tudo o que tenha uma tampa e venha num material que, ao ser reutilizado, não contamine a água, serve como garrafa de água. Basta um pouco de imaginação.
- Andar sempre com um lenço de pano/guardanapo. Para se produzir um guardanapo de papel é necessário abater árvores (que nos são muito úteis para absorver dióxido de carbono), utilizar (muita) água e bastante energia. Por isso, em vez de utilizar guardanapos de papel em restaurantes ou lenços de papel para nos assoarmos, nada melhor do que andar com um lenço de pano e eventualmente um guardanapo. Mais uma vez, não precisamos de complicar: qualquer roupa velha estragada serve para fazer panos. Basta costurar as bainhas para não desfiarem (ou, mais simples, utilizar uma tesoura de zig-zag para cortar).
- Andar sempre com um saco reutilizável. A chave, aqui, é reutilizar muito, porque um saco de pano consome muitos recursos a ser produzido, o que significa que tem de ser utilizado mais de 400 vezes para compensar o impacto ambiental de um saco de plástico «comum». Se utilizarmos o saco de pano todos os dias durante um ano e meio, já compensou. E não é assim tão difícil utilizar um saco de pano todos os dias. Aliás, difícil é não ter um sempre à mão, porque aparecem sempre coisas que temos de levar connosco.
Estamos a chegar ao fim, mas ainda falta uma dica essencial. Se a levar a sério, quase não tem de pensar em todas as outras que referi. Vamos a ela?
- RECUSAR aquilo de que não precisa. Inclui sacos de pano giríssimos que nos dão em eventos e que vão para a «pilha» dos sacos de pano, inclui a t-shirt branca que vai para o armário fazer companhia às outras cinco t-shirts brancas, inclui os guardanapos nos restaurantes, as garrafas de água em reuniões. Inclui tudo o que não precisarmos de ter na nossa vida. Ao fazer esta triagem daquilo de que precisava ou não precisava, cheguei a uma conclusão muito interessante: não preciso de utilizar papel higiénico. Sim, leram bem, mas isso fica para contar noutra altura.
Vamos colocar estas dicas em prática e acabar 2021 com uma pegada ambiental bem menor?