Quando pensa em Kama Sutra, o que lhe vem à mente? Não precisa de responder. Sabemos perfeitamente que aos olhos da esmagadora maioria das pessoas, este se trata meramente de um livro onde são reveladas todas as posições sexuais possíveis e imaginárias, das mais simples às mais acrobáticas. Mas (surpreenda-se), o Kama Sutra é bem mais do que isso.
Indo além daquilo que a cultura ocidental defende, falamos de algo que comporta muito mais do que pornografia primitiva ou posições exageradamente sofisticadas. O Kama Sutra é um livro que fala do amor como um todo, interpretando-o como algo sagrado, tântrico e intimamente ligado ao espírito e à conexão com o outro. Por isso, nesta espécie de bíblia do sexo, as posições constituem apenas 20% da sua verdadeira essência.
Então, o que é, afinal, o Kama Sutra?
Começando pelo princípio – a origem etimológica do termo – a palavra «kama» significa desejo (integrando desejos estéticos e sensuais), representando um dos quatro objetivos principais da vida (a abundância ou o prazer dos sentidos); e, por sua vez, a palavra «sutra» significa fio/linha, referindo-se a manual.
O Kama Sutra é, assim, um livro hindu antigo, originalmente escrito por um filósofo, que afirmava que a sabedoria sexual se tratava de uma forma de meditação e de contemplação da divindade. Com o avançar dos tempos, foram surgindo versões mais fáceis de compreender e mais concisas, onde se relatam as várias formas e o verdadeiro sentido do prazer sexual humano.
Uma vez que o conceito parte da cultura indiana, que é, não raras vezes, considerada mais espiritual do que as outras, o mesmo acaba por associar-se à alma. Portanto, o Kama Sutra acaba por ser mais do que um manual puramente sexual, já que nos ensina a levar uma vida humana mais completa e mais satisfatória.
Amor, família, prazer e desejo. Estes são os quatro pilares que integram a Natureza deste livro, que revela a importância de todas as outras variantes da vida, além do sexo.
Posições sexuais – e não só
Folhear o Kama Sutra não significa que folheará apenas um livro munido de posições sexuais arriscadas e malabarismos irrealizáveis. A vida quotidiana é também relatada em muitas versões deste livro, ainda que a sexualidade continue a ser a sua base por excelência. Isto porque o sexo é, aqui, entendido como sendo a base da vida, sendo a origem de tudo. No fundo, trata-se do «núcleo da existência».
A premissa
Sendo o Kama Sutra muito mais do que uma lista de desafios físico complexos – a pôr em prática no quarto – a sua premissa assenta na crença de que a reprodução é necessária para a sobrevivência dos indivíduos como um todo. Para uns, a reprodução é entendida como sexo; para outros, é entendida como uma espécie de arte do prazer.
Em algumas versões mais antigas da filosofia Kama Sutra, a envolvência de um determinado ser na atividade sexual é entendida como um ato espiritual, onde existe um poder pessoal que pode ser trabalhado e melhorado.
A explicação pragmática das várias expressões sexuais
Sim, neste livro são explicadas as várias posições sexuais existentes, de uma forma muito prática e explícita – com a ajuda de imagens elucidativas, em alguns casos. Mas o desejo sexual é, aqui, interpretado como uma oportunidade de libertação do poder pessoal de um indivíduo. A libido é sobre si, não sobre o outro. E o objetivo é alcançar uma vida mais prazerosa através dessa ajuda.
Com o tempo, o Kama Sutra, no seu estado bruto, foi-se aprimorando e adaptando à vida moderna, fazendo com que se pense, erradamente, que ao adquiri-lo se terá nas mãos meramente um manual de instruções para apimentar a vida sexual de um casal. De facto, pode ser tudo isto. Mas pode ser ainda mais, uma vez que a sociedade indiana fala de sexo e de amor de um modo muito mais completo e transcendente.
Desta feita, desmistifica-se o cariz meramente físico do Kama Sutra, já que este é, de facto, um texto sagrado, que contempla um guia sobre a arte de viver melhor, entendendo a filosofia do amor, o que desencadeia o desejo sexual e a fórmula para alcançar o equilíbrio das energias feminina e masculina.